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Na noite de 18 de novembro de 2025, o futebol caribenho escreveu uma página que jamais será esquecida. Haiti, Curaçao e Panamá garantiram suas vagas na Copa do Mundo da FIFA de 2026Canadá, Estados Unidos e México — e, entre eles, dois nomes que ninguém esperava: um país em colapso político e outro com menos habitantes que muitos bairros de São Paulo. A vitória do Haiti por 2 a 0 sobre a Nicarágua, no Ergilio Hato Stadium em Willemstad, foi mais que um jogo. Foi um grito de resistência. Um grito de esperança.

Um Haiti que jogou longe de casa

O Haiti não jogou uma única partida em seu próprio território durante toda a campanha classificatória. Por quê? Porque 85% da capital, Port-au-Prince, está sob controle de gangues. Em 2024, mais de 5.300 pessoas foram mortas em violência armada — segundo a ONU. O governo interino, liderado por Garry Conille, mal consegue manter a ordem. A Federação Haitiana de Futebol (Fédération Haïtienne de Football), sob a presidência de Yves Jean-Bart, foi forçada a transformar Curaçao em sua casa. Dez jogos como ‘mandante’, todos fora do país. E mesmo assim, terminaram em primeiro no Grupo C, com 11 pontos. Louicius Deedson abriu o placar aos 9 minutos, Ruben Providence fez o segundo no fim do primeiro tempo. O gol que selou a volta à Copa do Mundo após 52 anos. A última vez? 1974, na Alemanha Ocidental. Ninguém da nova geração tinha visto um time haitiano em Mundial. Agora, milhares dançaram nas ruas de Port-au-Prince, apesar da insegurança. Um evento oficial foi planejado para 19 de novembro — mas os organizadores sabem: pode não acontecer. A alegria é real. O perigo também.

Curaçao: o menor país da história da Copa

Com apenas 444 quilômetros quadrados — menor que a cidade de São Paulo — e uma população de cerca de 160 mil habitantes, Curaçao se tornou a menor nação da história a se classificar para uma Copa do Mundo. O presidente da Federação, Gilbert Martina, resumiu com uma frase que já virou hino: “Nunca deixamos de acreditar. Somos pequenos em tamanho, mas enormes em alma e coração.” O segredo? Um projeto iniciado em 2004. Parcerias com clubes holandeses como AZ Alkmaar e Feyenoord para identificar jovens de origem curaçaoense vivendo na Holanda — cerca de 300 mil pessoas. Naturalização estratégica. Treinamento técnico. Estrutura. O resultado? Um time coeso, disciplinado, que venceu o grupo com 12 pontos. Nenhuma das 14 tentativas anteriores havia dado certo. Agora, a ilha terá seu primeiro Mundial. Uma parada em Willemstad está marcada para 20 de novembro. A cidade inteira vai se vestir de amarelo e azul.

Panamá: a constância da América Central

Enquanto Haiti e Curaçao faziam história, o Panamá fez o que sabe fazer melhor: ser consistente. Sob o comando do técnico dinamarquês Thomas Christiansen, o time terminou o Grupo F com 15 pontos, liderando com autoridade. Foi a segunda vez que o país se classificou — a primeira foi em 2018, quando marcou o gol histórico contra a Inglaterra, por Felipe Baloy. Na Rússia, perdeu os três jogos, mas deixou uma marca. Agora, volta com maturidade. O Panamá, com 4,4 milhões de habitantes, é o único país da região que já conhece o palco mundial. E não vai se contentar com apenas participar. A expectativa é clara: passar da fase de grupos.

Um novo mapa da CONCACAF

A classificação de 2026 muda tudo. Pela primeira vez, a CONCACAF terá seis representantes diretos — os três anfitriões (Estados Unidos, México, Canadá) mais Haiti, Curaçao e Panamá. Jamaica e Suriname vão disputar as vagas restantes em playoffs intercontinentais em março de 2026. O torneio, com 48 equipes, é o maior da história. E o Caribe, que antes tinha apenas Cuba, Haiti, Jamaica e Trindade e Tobago como participantes, agora tem um quinto nome: Curaçao. Isso não é coincidência. É evolução. O analista Donald Wine II, da Stars and Stripes FC, chamou o dia 18 de novembro de “uma noite incrível para a União de Futebol do Caribe”. E ele não exagerou.

O que isso significa para o futuro?

O que isso significa para o futuro?

Haiti, com um PIB per capita de US$ 1.494 em 2024 (World Bank), não tem recursos para um sistema esportivo robusto. Mas tem paixão. E agora, tem visibilidade. O mundo vai olhar para suas crianças jogando em ruas esburacadas. Curaçao, com sua rede de talentos na Europa, provou que tamanho não é documento — e que planejamento de longo prazo paga. Panamá, com sua estrutura madura, serve de modelo para outros países da região. O que começou como um sonho distante virou realidade — e isso vai inspirar ilhas e nações que ninguém acredita que podem chegar lá.

Próximos passos

As equipes já começam a se preparar. O Haiti deve realizar uma cerimônia simbólica em Port-au-Prince, mesmo com riscos. Curaçao organiza seu desfile. O Panamá já treina para o sorteio dos grupos, que ocorrerá em dezembro. Jamaica e Suriname aguardam os adversários — que serão definidos pela FIFA em janeiro de 2026. Os jogos dos playoffs acontecerão em março. O calendário está aberto. O futuro, também.

Frequently Asked Questions

Como o Haiti conseguiu se classificar sem jogar em casa?

Devido à violência extrema em Port-au-Prince, a Federação Haitiana de Futebol foi forçada a jogar todos os seus jogos como mandante fora do país, principalmente no Ergilio Hato Stadium, em Curaçao. Ao longo da campanha, o time disputou 10 jogos como ‘casa’ em território estrangeiro, mas manteve a disciplina tática e a unidade emocional, o que foi crucial para terminar em primeiro no Grupo C com 11 pontos.

Por que Curaçao é considerado o menor país a se classificar para uma Copa do Mundo?

Com apenas 444 km² de área e cerca de 160 mil habitantes, Curaçao é menor que muitas cidades brasileiras. Apesar de ser um país constituinte do Reino dos Países Baixos, possui sua própria seleção nacional e federacao. Sua classificação em 2025 é a primeira da história e a menor por território entre todos os 228 países que já tentaram se classificar para a Copa do Mundo.

Quais são os outros países caribenhos que já participaram da Copa do Mundo?

Antes de Curaçao, apenas Cuba (1938), Haiti (1974), Jamaica (1998, 2015) e Trindade e Tobago (2006) haviam se classificado. Com a chegada de Curaçao em 2026, o Caribe passa a ter cinco representantes históricos, um recorde para a região e um sinal claro do crescimento do futebol local, mesmo com limitações econômicas.

O que mudou no futebol de Curaçao desde 2004?

A Federação Curaçaoense iniciou um projeto de identificação de talentos entre a diáspora de 300 mil descendentes de curaçaoenses na Holanda. Parcerias com clubes como Feyenoord e AZ Alkmaar permitiram treinamento profissional desde a base. A naturalização de jogadores com dupla cidadania, somada a uma estrutura técnica moderna, transformou o time de um conjunto de jogadores amadores em uma seleção competitiva, com jogadores atuando em ligas europeias.

Por que a Copa do Mundo de 2026 é tão diferente das anteriores?

É a primeira vez que a Copa terá 48 equipes — aumento de 32. Também é a primeira com três países-sede: Estados Unidos, México e Canadá. Além disso, a CONCACAF terá seis vagas diretas, o que amplia drasticamente a presença de nações menores. O formato inclui grupos de quatro times, com os dois melhores avançando — o que favorece equipes como Haiti e Curaçao, que podem surpreender.

Quem são os próximos adversários de Jamaica e Suriname?

Os adversários nos playoffs intercontinentais serão definidos pela FIFA em janeiro de 2026. Jamaica e Suriname enfrentarão seleções de outras confederações, como da Ásia, África ou Oceania. O vencedor garante vaga na Copa. Jamaica tem mais experiência, mas Suriname, com jogadores como theo Bess, tem potencial. A sorte dos rivais pode mudar completamente o rumo da campanha.